Capacitação de autarquias e revisão de critérios para a gestão de combustível
“Num determinado cenário meteorológico e de configuração do terreno, a gestão do combustível florestal por remoção ou modificação estrutural resulta em menor velocidade e intensidade (energia libertada) da propagação do fogo, naturalmente facilitando e aumentando a probabilidade de sucesso das operações de contenção e extinção, com diminuição da área ardida e dos impactes ambientais e socioeconómicos.” É desta forma que o Observatório Técnico Independente justifica a necessidade de existência de medidas de gestão de combustível para responder aos incêndios florestais, mas este órgão da Assembleia da República que reúne diversos especialistas levanta fortes críticas à política pública atual.
Segundo os autores, o Decreto-Lei nº 10/2018, de 14 de fevereiro, que altera o Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de junho, “define os critérios aplicáveis à gestão de combustível nas faixas secundárias e determina-a num raio não inferior a 50 m ou a 100 m, respetivamente para edifícios isolados e aglomerados populacionais”, determinando também que “o raio da gestão de combustíveis é idêntico em todas as direções, independentemente da existência de relevo que possa afetar as condições de progressão do fogo”, situação que importa corrigir.
Os investigadores apontam que, relativamente à proteção de edifícios e habitações, a gestão de combustíveis deve assegurar a intervenção de superfície nos primeiros 10 metros e que, até aos 30 metros, “deve ser evitada a acumulação significativa de combustível e assegurada descontinuidade vertical adequada, mas as distâncias entre copas a que a legislação atualmente obriga (4 ou 10 m) são excessivamente elevadas, não se justificando e podendo ter um efeito contraproducente, nomeadamente quando o arvoredo é de folha caduca. Os limites de 50 ou 100 m impostos pelo artigo 15.º da Lei nº 76/2017 (que altera o Decreto-Lei n.º 124/2006) relativo à intervenção em terrenos adjacentes a respetivamente habitações e povoações são claramente excessivos.” Alertam ainda que esta situação pode “ter implicações económicas relevantes que não favorecem a adoção das melhores práticas pelos proprietários”.
Para garantir a execução das intervenções nas faixas de gestão de combustível, os proprietários florestais estão obrigados a intervir até 15 de Março, prevendo-se que, perante o incumprimento dos proprietários, há um mecanismo legal estabelecido que permite às Câmaras Municipais substituírem-se aos proprietários até ao dia 31 de Maio, no entanto, muitas autarquias não estão devidamente capacitadas com meios técnicos, operacionais e financeiros para responder de forma eficiente a esta necessidade.
Assim, o Bloco de Esquerda considera que é necessário rever e atualizar os critérios legais de intervenção sobre a gestão de combustível, de forma a proteger as economias locais, o território e as populações dos incêndios de forma eficiente, mas também, capacitar as autarquias para responder de forma eficiente às suas responsabilidades a este respeito.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda, apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente Lei determina o estabelecimento de critérios mais atualizados e eficientes para a prevenção de incêndios através da gestão de combustíveis, nomeadamente através das faixas de gestão de combustível e dos mosaicos de gestão de combustível, assim como a maior capacitação das autarquias para responder às exigências legais neste campo.
Artigo 2.º
Revisão dos critérios de seleção das áreas a intervencionar
No prazo de três meses após a publicação da presente Lei, o Governo garante a revisão do Decreto-Lei n.º 124/2006, de 28 de Junho, que estabelece as medidas e ações a desenvolver no âmbito do Sistema Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios, acolhendo as recomendações do estudo técnico “Racionalizar a gestão de combustíveis: uma síntese do conhecimento atual” do Observatório Técnico Independente, de Dezembro de 2019, no sentido de otimizar os resultados do investimento em prevenção de incêndios, assegurando que “os critérios de seleção das áreas a tratar integrem da forma mais completa e racional possível a análise espacial do risco de incêndio, tal como determinado pelo regime histórico de fogo, combustibilidade e valores em risco”.
Artigo 3.º
Capacitar as autarquias para a gestão de combustíveis adequada
Até ao final do ano 2021 o Governo cria um programa de capacitação das autarquias, a partir de um levantamento de necessidades realizado de forma participativa, criando condições para que estas possam responder de forma mais eficiente e ecologicamente responsável às exigências legais a que estão submetidas no âmbito da gestão de combustíveis.
Artigo 4º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.